O envelhecimento ao redor do mundo: alternativas para o bem-estar e para a saúde da pessoa idosa

Por Julyanna Santos 20.08.2021

A população mundial está vivendo mais e, portanto, a curva demográfica que demostra o aumento do número de pessoas idosas, cresce vertiginosamente. Surge, então, um alerta para todos os países do mundo: é preciso criar políticas públicas capazes de proporcionar bem-estar e acolhimento eficiente para essa população; é bem verdade que são muitas demandas e isso só acentua o tamanho do desafio imposto.

Com a queda da mortalidade nas idades avançadas, houve um aumento considerável no número de pessoas com 80 anos ou mais. De acordo com as estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), pessoas nessa faixa etária, em 2011, representavam 1,6% da população mundial; as projeções indicam que esse número passará para 4,3%, em 2040. Ainda de acordo com a ONU, em 2011, a população idosa correspondia a 11% da população mundial e em 2050 corresponderá a 22%, o dobro da porcentagem anterior.

Dra. Gabriella Pequeno, médica geriatra e mestre em ciências médicas: “o que as pessoas buscam é felicidade. Então, quando elas percebem que o elixir da juventude não existe, elas fazem um questionamento “e aí, o que me faz feliz?”

Envelhecer com saúde e bem-estar sempre foi possível: manter uma boa alimentação, praticar exercícios, dormir bem e prezar pelo equilíbrio emocional, são alternativas para um envelhecimento saudável e feliz. No entanto, para que tudo isso aconteça, é importante que governos e sociedade civil formulem um pacto de assistência à essa população; isso já acontece em alguns lugares do mundo. Para conversar sobre este tema, o programa Fortaleza 6.0, do Projeto Fortaleza Cidade Amiga do Idoso, convidou a médica geriatra e mestre em ciências médicas, Dra. Gabriella Pequeno. Confira trechos do bate-papo!

Portal Fortaleza Cidade Amiga do Idoso: Há uma mudança acontecendo: de atitude e de cultura. As pessoas começaram a refletir sobre o que querem em seu envelhecimento. Você acredita que no futuro teremos condições de envelhecer melhor?

Dra. Gabriella Pequeno: A conquista do século XX foi viver mais. A nossa conquista agora precisa ser viver mais e viver melhor. É isso que estamos em busca.

Portal Fortaleza Cidade Amiga do Idoso:  Países da Europa se prepararam para envelhecer de uma forma lenta e hoje eles possuem uma cultura voltada para essa forma de viver, para chegar à velhice com maior qualidade de vida. O que essas sociedades estão fazendo para atingir esse bem-estar social?

Dra. Gabriella Pequeno: Esses países, geralmente países desenvolvidos – europeus e asiáticos -, estão na lista dos países que possuem uma maior proporção de idosos em detrimento dos jovens. Portanto, são as sociedades em envelhecimento. Falamos sempre dos três grandes gigantes do envelhecimento: o Japão, a França e a Alemanha, porque formam sociedades que envelheceram e conseguiram um status de bem-estar social; estão com suas contas equilibradas do ponto de vista previdenciário. Tem que sair da nossa mente que cuidar do idoso é um gasto; não é um gasto, é um investimento. O problema não é ter 85 anos; é ter 85 sem conseguir tomar banho, sem conseguir comer, sem conseguir viver. Assim, nestes países, foram adaptadas estruturas para acomodar o envelhecimento saudável, os chamados residenciais de autonomia, e criaram também unidades de referência para identificar sinais de perda de autonomia que possam ser revertidos. Dessa forma, reduziram de forma significante o número de internação dos idosos, melhora no treinamento e na qualidade do trabalho, melhora na qualidade de vida nesses pacientes e utilizaram soluções tecnológicas para que essas pessoas conseguissem mais autonomia. Com isso, tirou-se aquele estigma de “estou gastando com idoso”, para o “estou investindo no idoso”. Além disso, a população foi convocada; o cidadão começou a pensar em como quer envelhecer, caso aconteça de perder a autonomia. Esses países conseguiram se organizar utilizando metodologias científicas e demográficas para saber quem são os idosos vulneráveis e as pessoas em si começaram a se programar. Todos querem viver muito e viver bem, mas caso isso não aconteça, já estão programados.

Portal Fortaleza Cidade Amiga do Idoso:  Você acha que o Brasil está preparado para realizar essa curva demográfica onde idosos serão um número consideravelmente maior do que nós vemos hoje?

Dra. Gabriella Pequeno: Não, infelizmente a gente ainda não se programou pra isso. Não falamos sobre como vamos envelhecer. Nem do ponto de vista familiar! Nem do ponto de vista de políticas públicas, ainda estamos engatinhando nesse assunto. O ideal é que a gente acelerasse. Então, embora os países desenvolvidos tenham maiores índices de população idosa hoje, os países em desenvolvimento como o nosso estão envelhecendo mais depressa. Então, de certa forma, países como Japão, França, Alemanha envelheceram, mas eles tiveram mais tempo para envelhecer e fazer essa transição. Nós temos pouco tempo. Aqui a taxa de fecundidade baixa, as pessoas estão tendo pouco filhos, e, ao mesmo tempo, estão vivendo mais. A Fundação Seade já detectou que a cidade de São Paulo, com 14,7% da população idosa, necessita hoje de reajuste e reorganização do Sistema de Saúde. Uma coisa boa que precisa ser dita é que apenas uma pequena proporção dos idosos é dependente de cuidados, então não seria necessário um investimento em grande escala. E uma outra coisa que precisa ser pontuada é que ter boa saúde na velhice não quer dizer ausência de doença. A gente pode ter uma doença, mas se a gente for capaz de fazer as coisas e julgar o que é importante e o que não é, a gente continua bem, produzindo, e vivendo de uma maneira feliz.

Portal Fortaleza Cidade Amiga do Idoso:  Essa busca pela “juventude eterna” que vem sendo vendida há muito tempo já começou a ser trocada pela ideia de envelhecer melhor?

Dra. Gabriella Pequeno: Sim, até porque as pessoas estão ficando mais alertas e conscientes da realidade. E, no fundo, o que as pessoas buscam é felicidade. Então, quando elas percebem que o elixir da juventude não existe, elas fazem um questionamento “e aí, o que me faz feliz?”. Então, no ciclo da vida, a pessoa se questionar e se programar é um grande marco. “Ah, eu tenho 60 anos, eu tenho expectativa de vida de mais 30 anos… O que vou fazer com esses mais 30?”. Então, acho que estamos em um terreno fértil pra falar sobre esse assunto com as pessoas, principalmente durante a pandemia, em que nos descobrimos vulneráveis. É nesse momento que questionamos a vida, como posso ter qualidade de vida. Conversar sobre ser jovem agora é coisa do passado.

Clique aqui para assistir entrevista da Dra. Gabriella Pequeno ao Programa 6.0, na Rádio Tempo.