A importância da atividade física remota durante a pandemia: desafios e preocupações

Sobre Atividade Física

A atividade física é todo o movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos que resulta em gasto de energia. Pode ser realizada em casa (nas atividades domésticas como varrer, lavar o chão e capinar), nos momentos de lazer (sessões de exercício físico ou de “ginástica”) e como forma de transporte (ir a pé ou de bicicleta para o supermercado, farmácia, trabalho, etc.). A atividade física tem diferentes níveis de dificuldade ou intensidade. Estas podem variar desde leve (quando praticamente não existe alteração no estado físico geral), até muito elevada (quando são verificadas alterações importantes de respiração e ritmo cardíaco).

Todas as pessoas, desde a infância até a idades avançadas, devem ser encorajadas a fazer atividade física para ter uma boa saúde e qualidade de vida. Isto tem sido demonstrado por pesquisas científicas no mundo todo, sendo que a Organização Mundial da Saúde define a dose mínima de atividade física que os cidadãos devem realizar para manter e ou melhorar a sua saúde. No caso particular dos idosos, esta dose é de 30 minutos por dia, 5 dias por semana de atividades aeróbias (como a caminhada ou a dança, por exemplo). A estas, devem ser acrescentadas 2 a 3 vezes por semana de exercícios de fortalecimento muscular, equilíbrio e flexibilidade. Doses menores de atividade física podem ser realizadas por idosos que não estão acostumados a fazer exercício físico e/ou por aqueles que passam grande parte do dia sentados, não esquecendo todos os que têm indicações médicas específicas para o efeito. Isto quer dizer que mesmo e um pouquinho de atividade física é melhor do que nenhuma.

Estudos que avaliaram a quantidade de atividade física de centenas de milhares de pessoas no mundo tudo, revelaram que cerca de 77% da população mundial não cumpre a dose de atividade física recomendada, sendo a inatividade física o 4º fator de risco para a mortalidade por todas as causas.

Fazer atividade física dentro das doses recomendadas traz muitos benefícios para a saúde, bem-estar e para a economia. Para além disso, a atividade física é uma ferramenta importante para a socialização, inclusão social e desenvolvimento de aspectos psicológicos. Neste ponto, o engajamento dos idosos em programas de exercício físico representam, muitas vezes, o único contato social com outras pessoas.

Com a pandemia pela COVID-19, a Organização Mundial da Saúde tem vindo a encorajar a realização de atividade física regular para manter ou melhorar o sistema imunitário. Como é sabido, o envelhecimento acomete todos os sistemas do corpo, incluindo o sistema imunitário. Embora entendamos que o efeito da prática regular de atividade física no sistema imunitário seja positivo, ainda não há um consenso absoluto, dadas as variáveis que devem ser consideradas como a intensidade, duração, tipo de exercício e regularidade do treino. Alguma evidência científica sugere que as pessoas idosas que praticam atividade física regular comparativamente aquelas que não praticam, têm melhores respostas às vacinas da gripe sazonal e ao vírus H1N1. Eventualmente o mesmo poderá acontecer para a COVID-19, caso sejam desenvolvidas vacinas específicas.


Sobre o Confinamento e Atividade Física

O confinamento parece ser a chave para controlar a progressão da pandemia pela COVID-19. É uma medida extrema, mas necessária e eficaz, tendo, contudo, consequências psicológicas, sociais e implicações na saúde em geral. Em Portugal, por exemplo, o confinamento ajudou a achatar a curva da 1º onda de COVID-19, mas também foi observado o fenômeno do “medo” das consultas médicas presenciais em hospitais públicos e privados. A procura pelos cuidados médicos e a realização de exames de diagnóstico reduziram de forma importante. O número de atendimentos e intervenções a pessoas com acidentes cardiovasculares reduziu significativamente, impactando na mortalidade cardiovascular. Outro exemplo, foi o aumento de amputações em pacientes diabéticos porque estes deixaram de ir às consultas médicas de rotina.

Se por um lado o confinamento modificou a atividade física e o tempo gasto em comportamentos sedentários, por outro lado trouxe a oportunidade de desenvolvimento de atividade física remota, que é aquela realizada à distância, recorrendo a ferramentas como a internet. A realização de atividade física remota por pessoas adultas parece ser de implementação fácil e adesão satisfatória. No idoso, isto já não é tão simples. Primeiro, existe uma barreira de medo (quase aversão) à tecnologia. Segundo, existe um custo quer na compra da tecnologia, quer no acesso à internet, que pode ser um problema intransponível. Terceiro, o número de pessoas mais velhas que não sabem usar a tecnologia é elevado e, por isso, devem ser capacitadas. Resumindo, no idoso, a implementação da realização da atividade física remota (e prestação de outros serviços, como consultas médicas à distância) é um desafio complexo, mas uma oportunidade valiosa que surgiu imperiosamente com a atual pandemia. Por isso, se a COVID-19 representa um mar de desafios, representa também um oceano de oportunidades.

Os programas de atividade física remota devem ser desenvolvidos por profissionais com competências específicas, especialmente quando se trata de programas para populações com particularidades importantes, como os idosos. Existem influenciadores e/ou youtubers de sucesso (que apareceram antes e depois da COVID-19) que desenvolvem programas de atividade física remota sem, no entanto, comprovar a suas certificações e competências e sem conhecer os seus “clientes”. Este é o primeiro cuidado que devemos ter: aceder a informação credível, de pessoas devidamente formadas do ponto de vista científico e pedagógico. Dito isto, gostaria de sugerir que os idosos do Programa Fortaleza Cidade Amiga do Idoso aderissem ao acompanhamento dos programas de exercício planejados e orientados pelos profissionais do exercício, que já provaram as suas competências/conhecimentos antes do confinamento e que conhecem cada um dos idosos do projeto.

Outro canal importante na promoção da atividade física e na redução do comportamento sedentário é a rádio.  A rádio atinge facilmente a maior parte dos nossos idosos e não requer capacitação e custos adicionais. Claramente que os programas de rádio não prescreverão sessões de exercício físico, mas podem encorajar a realização da atividade física aeróbia e a redução do tempo sedentário. Por exemplo, no tempo dos anúncios (propaganda) podem relembrar os idosos de se levantarem do sofá, cadeira ou cama a cada 30 minutos. Outra estratégia pode passar por desafiar os ouvintes a dançarem algumas músicas ao longo das suas transmissões.

A televisão, em grande parte responsável pelo elevado número de horas na posição sentada, também pode dar o seu contributo para encorajar a prática regular de atividade física e redução das horas na posição sentada. Assim como existem programas escolares lecionados através da televisão para as crianças (e que ressurgiram com a COVID-19, pelo menos em Portugal), podem existir programas de atividade física para idosos que usam este mesmo meio. Estes programas devem ser simples e genéricos utilizando materiais caseiros e exercícios com o próprio peso corporal. Obviamente que estes desafios e propostas lançados representam apenas sugestões que podem (ou não) ser testadas e validadas do ponto de vista da eficácia científica.


Considerações Finais

– De uma maneira geral, é importante sensibilizar a população idosa para a importância da atividade física, relembrando que os benefícios são sempre superiores aos riscos da prática;

– Se neste momento os programas remotos de atividade física representam um recurso necessário transitório (esta é a minha esperança), os programas presencias deverão ser retomados assim que possível. Afinal, quem realiza a atividade física nos seus tempos de lazer, conhece muito bem os benefícios psicológicos e sociais;

– Para já, mantenham-se em casa, cumpram o distanciamento social e utilizem as máscaras sociais em todos os contextos necessários. Lavem muito bem as mãos, durante 20 segundos, com sabonete e água corrente, muitas vezes por dia e especialmente antes de sair de casa e assim que regressarem;

– Mantenham-se fisicamente ativos, com uma alimentação saudável e equilibrada!

– Por fim, busquem informação de confiança, com base da evidência científica.

Lucimere Bohn, PhD em Atividade Física e Saúde- Universidade do Porto. Professora da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

Pesquisadora do Centro de Investigação em Atividade Física, Saúde e Lazer, foi nossa entrevistada no Programa Fortaleza 6.0, na Rádio Tempo, 103.9, no dia 23 de maio de 2020.

Ouça o programa na íntegra no podcast:

 

Saiba mais sobre o Programa de Rádio

O Programa Fortaleza 6.0 tem transmissão ao vivo, todos os sábados, das 10 às 11horas. A programação promove ações do projeto Fortaleza Cidade Amiga do Idoso; entrevistas com profissionais que trabalham em prol do envelhecimento saudável e conversas com idosos que são exemplos por saberem conduzir as suas vidas após certa idade com tanta vitalidade, autonomia, disposição e alegria de viver.